Boas Vindas!

Aos amantes do Direito, enquanto manifestação mais pura da Ética Filosófica, enquanto parte do estudo das Humanidades Clássicas; Aos amantes da Literatura, da Retória e da Estética; Aos amantes do Belo. A todos vocês, inclusive, os curiosos, ofereço este trabalho tão revigorante, as palavras que escondem dentro de si próprias maravilhosos significados, uma verdadeira aventura rumo à contemplação da Realidade, à libertação da mítica caverna de platônica, à redenção do gênero humano que é livre para conhecer, amar e servir.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

"Imperceptivelmente em nosso quarto"

Da consciência

Vê, Thêmis, a desgraça que se abate sobre a terra! Vê a fome, a miséria, a promiscuidade; Vê a chacina dos que visivelmente não morrem, mas dos quais declina-se a alma; Vê a mentira, a luxúria e a injustiça a reinarem, vê. Tu, senhora de destinos, bússola da verdade plena, insensível para as vãs impressões, aponta-me ainda uma razão para crer na possibilidade do novo, que ainda existe razão sobre a terra, que ainda reluz a consciência humana, de que é possível alcançar-se a PAZ!

A revolta contra o absoluto toma até os seres mais espirituais quando da contemplação do grito desumano bradado ao infinito pela imensa multidão de injustiçados, sobretudo, em razão do silêncio de cumplicidade dos cordeiros apascentados pelo capital, pela velocidade e pelas serpes dos próprios interesses. Entretanto, o que menos há é uma “culpa de Deus”, que permite tudo isso. O Homem, esse sim, lupus hominis est. O eterno jamais intervirá contra a liberdade do homem, sob pena de contradizer-se no ato gerador de sua obra mais perfeita. O homem é livre para administrar tudo o que existe, com justiça.

O pão que falta à mesa dos miseráveis é aquele que compõe as sobras dos afortunados. A estes não pertence, mas aos que coletam à margem de nossas calçadas e lixões. Falar sobre os pobres agride, sim, agride aos que desconhecem a pobreza: as palafitas, os morros em situação de risco; agride aos que ignoram a dor cálida da fome, a privação do medicamento, a não prestação da assistência médica. A violência, muitas vezes é desencadeada pela ausência dos bens da vida mais elementares, os quais sobram a alguns de modo a exgugitar-se. Penso que o tratamento para a bulimia e anorexia, entre outros, seria um passeio por algumas das nossas favelas, onde não há sequer um pão para se alimentar os filhos. “Pobres, sempre os tereis”, garante-nos a Escritura. Miseráveis, não!

O que é pureza para pessoas conduzidas pelo prazer? A luxúria invade pelos meios de comunicação nossos lares, nossas famílias. Haverá justiça onde há luxúria? Já disse o brocardo latino: onde a soberba há também luxúria! E onda há a primeira, inexiste a reta compreensão da verdade, esta imprescindível à própria Justiça. O sentimentalismo, a busca pelo prazer são coisas boas se restritas no equilíbrio fundado na Razão. Ora, inexistindo a reta compreensão das coisas não se pode elaborar uma verdade sobre as coisas. O homem que não compreende o valor de si ignorará de certo o valor de seu semelhante, seus relacionamentos serão desorientados, sem verdade. Relacionar-se com o sexo oposto é muito mais do que regras de conquista ou dicas de kama-sutra, é ser capaz de reconhecer a grandiosidade e a preciosidade que estão contidos no outro. A simples regra de fazer aos outros o que aprazeria a si é válida desde que parta dos retos pressupostos de ser homem, de ser mulher. A pureza é o atestado de auto-domínio, ser Senhor de Si mesmo, é a base para um caráter sólido que faz o que deve ser feito e não o que simplesmente ditam as emoções. Ademais, é a própria liberdade, de ser inteiro, completo para a Bondade, Beleza, Verdade, Justiça e Unidade supremas.

Há muito emplementou-se uma opinião de que as desgraças não deveriam recair sobre as pessoas “boas, justas, honestas”... sob o argumento de que nunca se roubou, nunca se matou. É muito bom dizer que nunca se roubou, quando na realidade, sonegam-se os impostos, não se arca com os encargos sociais dos empregados, quando se atrasa o pagamento deles por escárnio, quando se negocia com o vendedor até sua margem mínima de sustento e este aceita o trato para não perder o cliente. Reter injustamente. O pai que retirou do filho o direito de ter um pai, de igual modo a mãe, fazendo sua prole orfã de pais vivos. Nunca se matou? E o que se diz da inveja desgraçada que conduz à maledicência, à calúnia, à difamação, à injúria. Não se matou, mas se extorquiu aniquilando a liberdade – bem caríssimo ao homem. Não se mata mas se faz fofoca, mina-se a credibilidade alheia sem o mínimo senso de responsabilidade. E o que seria articular o mal contra alguém? O corpo pode nem cair por terra, mas esta mesma engole a moral, a dignidade do vilipendiado. E isso brada justiça.

Haverá paz onde não há a reta compreensão da realidade? Caminhar só é de imensa coragem e insensatez, o preceptor deve apontar o caminho de evolução, corrigir, incrementar. A reta compreensão vem a partir de um movimento de mudança interior, o qual acarretará no cambiamento das ações e, segundo um pensador antigo, até mesmo do embelezamento das feições. Isso é urgente. A velociade e vil prazer entorpecem e não preenchem o homem.
A consciência é o lucernário do templo humano. Ela nos persegue, inevitavelmente! Ela nos convida sempre à reflexão, nos acusa, nos aplaude, nos incita, nos repreende. A consciência deturpada ignora a verdade, mas mesmo assim, sabe que orienta a ação humana. Qualquer um é capaz de dizer da ação por si praticada boa ou má. Essa maravilhosa faculdade está presente na vida do homem, graças à razão e é fundamental para sua felicidade plena. As boas ações naturalmente alegram, trazem paz enquanto as más provocam o desejo natural de reparação, nos entristecem.

A luta do homem não deve ser contra ele próprio, mas contra os elementos externos que o fazem deixar de ser ele mesmo ou impedir seu auto-conhecimento, reta compreensão e a orientada ação. Que nossas conciências jamais nos assombrem com seu aspécto hórrido, que jamais nos invadam corpulentas e negras, que nunca nos persigam lançando-nos no rosto crimes. Pois tudo isso ela pode fazer prescindindo da vontade humana: acusando, persiguindo, julgando, condenando. Com efeito, não há pior codenação do que a pronunciada contra si próprio. Ela acompanha até a satisfação do justo e, se não acontecer, até a própria morte.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

A Consciência Humana

O Morcego
Augusto dos Anjos

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
"Vou mandar levantar outra parede..."
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre minha rede!
Pego de um pau. Esforços faço.
ChegoA tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

HOMENAGEM

OS SAPOS
Manuel Bandeira
Enfunando os papos,
Saem da penumbra
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:

- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" -- "Foi!" -- "Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia
Mas há artes poéticas . . ."

Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei" - "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!"

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- "A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo."

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;

Lá, fugindo ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo cururu
Da beira do rio...

1918

ARTIGO INAUGURAL

SER O QUE DEVEMOS SER

O desejo de infinito que carregamos nos mais profundo de nossas almas garante-nos, dentre outras coisas, uma vida para além do contingente, do tempo, do espaço. Uma vida eterna. Por isso que não podemos cessar de olhar para o alto e perceber-nos caminhantes nesta estrada do presente. Isso traz consigo uma responsabilidade: a de sermos o que realmente devemos ser.

Hoje o nosso mundo padece de uma crise estrutural. Não há mais líderes como outrora. Já se foram os ideais sublimes, os valores. A honra e a moral foram substituídas pelos valores da velocidade e do capital. Nesse momento, as pessoas são reduzidas a números e sua dignidade é vilipendiada.

Homens que não sabem quem realmente são estão nas esferas de Poder a exercer a oportunidade e a conveniência segundo o império da egoística razão do bem estar pessoal. Essa é a origem da injustiça, posto que se inicia no próprio homem em face de si mesmo simplesmente porque não sabe a verdade sobre si, enquanto ser e, sem verdade, não pode haver justiça, só há contradição. Apesar de Aristóteles asseverar que o homem n pode conscientemente querer para si o mal. Assim, a imaturidade é camuflada por uma armadura de poder, prazer e possuir. Detém-se conhecimento, bens, prestígio, honrarias que adornam um caráter frágil e detrítico.

O desejo do infinito é desejo de perenidade, de eternidade. E o homem se eterniza nas suas obras. Havard, doou parte de seus bens pelo bem do conhecimento; Nobel, que ainda hoje in memoriam premia as grandes iniciativas. Logo vê-se que o capital em nada dignifica o homem. O homem dignifica-se pelo reto obrar. Quão bom dizer-se: tal pessoa passou fazendo o bem, foi justa, íntegra, honrada. Nesse sentido, criou-se o brocardo: “homem, se queres ser justo, lembra-te que vais morrer”. Lembrar da morte só nos recorda que não somos deuses, que somos homens e mulheres do presente destinados ao infinito.

Efetivamente, não há como se pensar feliz numa vida irrefletida conduzida pela opinião da massa ou pelos apelos da mídia. Será alienada. A verdade há de ser partejada, como relaciona o método Socrático. O homem tem de conhecer a si mesmo. É preciso aventurar-se na louca e alucinada busca do próprio “eu” e ter a audácia de andar na contra-mão, quando preciso. Os exclusivos critérios de estima alheia e respeito humano posteriormente nos frustram, porque existem em detrimento do que deveria ter falado, calado, entendido, propalado. E, mais uma vez, decai a realidade sublime da humanidade diante do contingente, do efêmero.

Eternizemo-nos na Justiça, na Verdade! Enfileiremo-nos como escravos da Justiça, obstinadamente, sem olhar para trás. Assim seremos felizes, eternizando-nos em meio a efemeridade desse século na Justiça, que é eterna. Nesse sentido, muitos problemas surgem colateralmente: o próprio conceito de justiça; a ética, a moral e o tempo; legitimidade dos atos fundados na simples autoridade.

Consumamos mais tempo com a estética, pois a verdade é essencialmente Bela. O tempo é por demais curto diante da eternidade. A moda passa, os desejos instintivos também e assim mesmo passam os valores imperativos do respeito humano e tudo isso é por demais frustrante porque tolhem o homem de crescer. Certa vez disse-me o reitor: “se queres ser feliz, cresce para Deus e para o Saber, pois nesses dois ninguém te poderá tolher”. Onde estão os círculos de pessoas a recitar poesias? A falar de política e filosofia, a debater temas polêmicos e controvertidos? Onde estão os grandes ideais e os projetos de vida?

A grande verdade é que já somos em potência tudo o que anelamos ser. E absolutamente nada pode nos frear nessa aventura a não ser nós mesmos. Terá se apagado a brilhante rubra chama dos grandes oradores? Os pensadores do futuro da Escola do Recife, onde estão? Onde estão os discursos e pensamentos ressonantes outrora contidos pelas abóbadas?

Eis o grande desafio: gerar, primeiro em nós, a paz a qual imprescinde da justiça e, esta, da verdade. Para além, vê-se a sociedade local e a nação. A corrupção de um só homem é prova da corrupção de sua sociedade. É como o religioso que usurpa de suas funções ou o que assume posto de comando ou chefia e exerce arbitrariamente. Tais simbolizam a fragilidade, são a gangrena do imenso e lindo corpo de que fazem parte, o qual fazem muito sofrer.

A ação é o caminho para tudo isso. Chega de infrutífera omissão e de falácias inebriantes. Deixe-se deslumbrar por um novo tempo reluzente descortinado pela mágica razão veraz e autêntica. Viva e deixe viver, ame e deixe amar, entregue e deixe entregar. Provoque-se, questione-se, litigue-se, pugne-se pela autenticidade nas relações pessoais e nas estruturas que o cercam. O mundo não mais precisa de olhos que se cerrem para o tráfico de drogas na esquina, olhar e silêncio criminosos que corroboram com toda a escala do mercado negro que a muitos já sangrou e sangra em nosso país. Não mais se precisa de omissos cientes do vilipêndio da vida, no aborto, contribuindo para o aumento dos brados desumanos sufocados pelo envenenamento salino ou pela abjeta mutilação mecânica dos fetos. Não mais se precisa da omissão que patrocina a violência doméstica. Não mais se precisa do pacto perverso de coação nas estruturas alienantes e retrógradas que temem o novo e o diálogo. E o interessante é notar tais pessoas a pronunciar putrefamente o vocábulo “paz”. Insensatos!
O grande brocardo “o direito não socorre os que dormem” vem incrementar essa abordagem. E somos exortados para com tochas acesas em punho ser o que devemos ser, com olhos no além e pés em solo firme; com firmeza, obstinação e ternura; com coragem, audácia e equilíbrio, incendiar a face desta terra de amor, justiça e verdade!